quinta-feira, 22 de setembro de 2011

INCOERÊNCIAS (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

    Trago as costas arqueadas pela força do chicote
    e o risco da navalha desenhado em meu rosto.

    Trago flechas encravadas espalhadas pelo corpo
    e as mãos ensangüentadas pela dor de tanto esforço.

    Trago a lágrima chorada na plenitude dos meus ais
    e no peito a certeza de chorar ainda mais.

    Trago a pele já curtida por caminhos, invernadas
    e o demônio aprisionado, companheiro de jornada.

    Trago o santo e o obsceno em batalhas desmedidas
    e a sanha desta vida por atalhos, despedidas.

    Trago a escolha de um rumo, conseqüências, incertezas
    e perda eminente por ter sido incoerente.

    Trago lábios encharcados de sorrisos e ternuras
    e nos versos o veneno, a inquietude e a loucura.

    Sou poeta, sou cigano, eremita, vagabundo,
    coisa incerta e descoberta pelas trilhas deste mundo.

    Ventania, correnteza, mar bravio, aspereza,
    água pura e aguardente, sangue frio e sangue quente.

    Sou deserto, sou oásis, sou procura, sou viagem,
    sou espinho que arranha, sou verdade, sou miragem. 

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