sábado, 24 de setembro de 2011

ACONTEÇA O QUE ACONTECER (PROSA POÉTICA)



NALDOVELHO

Tem dias que a poesia amanhece cansada, fastios de desentranhamentos, escassos os versos que eu tento, dias nublados demais! Onde só restam o silêncio e a quietude da alma, pois nem o vento abusado se atreve a invadir-me o quarto, ainda que aberta a janela. Dias de calmaria, coisa incomum nestes tempos de tantos açodamentos.

Tem dias que eu amanheço distante, a trilhar caminhos ausentes, a sonhar vazios presentes, pois nem sempre te vejo ao meu lado, posto que, quando te procuro, já não estás mais. E aí, é um quê de choro não choro, não sei se vou ou te espero, e o que eu percebo é sempre nublado, embaralhados os pensamentos, que até os versos que eu tenho, confusos e destrambelhados, não transmitem o sentimento, nem o estrago que tudo isto me faz.

Tem dias que eu amanheço tormenta de poesia inquieta e ardida que por quase nada arrebenta as comportas e deságuam lágrimas densas, que, por tanto tempo reprimidas, espalham poemas, cantigas a dissolver feridas cristalizadas e a curar a dor que atormenta.

Mas tem dias que eu amanheço magia de pássaros barulhentos, de flores em animada conversa, de sol que exibido se apressa em mostrar as belezas da vida. São dias de sorriso nos olhos, de buscas e esperanças confessas, pois por mais que a tormenta me escolha, o poeta sobrevive inteiro no sagrado ofício que eu tenho de ser poesia em festa, aconteça o que acontecer.

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