NALDOVELHO
   É o curso de um rio em direção ao mar,
   é um cardume de peixes vagando pelo oceano,
   é uma gota d’água se evaporando ao sol
   e as ondas do mar a lapidar o rochedo,
   é uma lágrima derramada por um amor perdido,
   é um grito de socorro no meio da vida,
   é uma estrela cadente em direção ao nada,
   é uma chegada a lugar algum,
   é uma partida pra lugar nenhum,
   é um barco sem porto, sem rumo,
   é um cais sem amarras, é uma nuvem cigana,
   é um coração calado, é um trem fora dos trilhos,
   é a minha voz sufocada, é a estrada e o corte,
   e os cacos de vidro espetados pelo corpo,
   é o café quentinho, depois o cigarro,
   madrugada ainda, noite de insônia,
   é o bar da esquina da rua lá de casa,
   é o jornal matutino e as notícias gritando:
   é o sangue na rua, é o menor abandonado,
   é o pivete armado e o espinho espetado na palma da mão.
   É um homem chorando, é outono...
   e as folhas caindo pelas ruas da cidade,
   e os meus olhos parados e a garganta engasgada,
   vida que segue na solidão do meu quarto, 
   é a poeira na estante e os livros guardados
   e a mesma música a seduzir meus ouvidos,
   é o mesmo perfume trazendo saudades,
   é o sol que nasce todos os dias,
   é a lua amiga, companheira constante,
   é a sede, a fome e o sono,
   é a poeira e os cacos espalhados pela casa,
   é um homem cansado que insiste em sorrir,
   é a crença em Deus sempre presente,
   é a poesia e o sonho, defeito de um tolo,
   é a nostalgia presente em cada detalhe,
   é a semente plantada, esperança de vida,
   é a vida de um homem que acredita no amanhã.