NALDOVELHO
O cheiro de asfalto, o sinal, o assalto,
a buzina dos carros e a urgência alucinam,
até hoje padeces em loucas chacinas.
O cheiro de cola, o menino, a esmola,
caco de vidro espetado, sangue no chão,
a cusparada no rosto, a bofetada, o desgosto,
dilaceram os espinhos cravados pelo corpo.
O gosto amargo, o olhar injetado,
na subida do morro, o fuzil, o desgosto,
engatilhadas as armas, a sirene, o sufoco.
Ela ainda é uma menina, que triste sina!
Até hoje padeces da dor que acontece
na bala perdida, lá se foi uma vida.
Na demência que implora uma prece em vão,
pois as portas dos templos permanecem fechadas.
A fome acontece, encruzilhadas que ensinam
que a mão do mais forte explora e elimina
a quem possa interessar salvar a menina.
Prostituiu-se tão cedo e virou avião.
E o menino, um soldado de punhos fechados,
de arma na cinta, vai fazer um estrago...
O traficante sorri da inocência perdida,
faz pouco dos desfiles, passeatas, cartazes,
já é um pouco tarde pra dizer eu não quero,
o acerto de conta não tarda a chegar.
Até hoje padeces por curar meus pecados!
Cidade nublada, cidade do medo,
o cheiro de asfalto, o sangue, o segredo,
não faz muito tempo procissão do Senhor Morto
passou por aqui e me trouxe conforto?
Não faz muito tempo, no centro da praça,
alguém riu da desgraça, do ultimato, da ameaça.
E o Teu corpo tombado, humilhado, ferido.
Quanta miséria e o meu povo nem olha,
mas assiste ao filme, Paixão de Cristo, o
Calvário,
a mensagem ao contrário!
Depois, quem sabe um calmante?
Muda de canal, assiste o noticiário...
E vai dormir!
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