sábado, 22 de outubro de 2011

ADÁGIO (ARQUIVO)


   NALDOVELHO

   Eu manipulo histórias
   como quem constrói um sonho,
   para que no fim da noite
   envolto em teias
   ele possa me alimentar.

   E a cada amanhecer eu me supero,
   atravesso portas, corredores,
   esqueço promessas, louvores,
   percorro ruas povoadas de sombras,
   carregando permissividades,
   desculpas, loucuras, besteiras
   e deposito todas estas inconveniências
   no frio mármore que existe em Seu altar.

   E toda a vez que o faço eu me absolvo,
   mas ao mesmo tempo me entristeço
   na tentativa de mostrar as pessoas
   as feridas que trago latentes,
   as dores que finjo inexistentes,
   pois o sol em mim agoniza mais cedo
   e eu retorno sempre cabisbaixo
   àquilo que chamo de lar.

   Eu manipulo sonoridades
   como quem constrói um adágio,
   e assim enoiteço nostálgico,
   sufocado pela fumaça
   de nem sei quantos cigarros,
   com uma garrafa de conhaque
   bem pra baixo da metade,
   e uma vontade enorme de dormir.

   Eu manipulo palavras
   como quem comete pecados,
   e a cada poema eu transgrido,
   cometo um monte de sacrilégios
   na esperança de chamar Sua atenção.

Nenhum comentário:

Postar um comentário