sábado, 19 de dezembro de 2015

O SANGUE DE UM TOLO

    NALDOVELHO

    O sangue de um tolo,
    as lágrimas de um louco,
    a lua esmirradinha
    refugiada em meus braços,
    nasceu num leito de rio,
    margem direita em meu quarto,
    margem esquerda num abismo.
    E os trilhos daquele trem
    que nem locomotiva tem,
    seus vagões jazem abandonados,
    não transportam mais ninguém.

    A poesia que eu trago comigo
    cada vez mais confusa,
    versos extraídos do meu umbigo,
    às vezes molhados de outono,
    em outras, sementes de sonhos.
    E o sol de todos os dias,
    às vezes exibido, às vezes escondido,
    entardecer nublado de maio,
    anoitecer chuvoso em meu quarto.

    Um bando de pássaros revoltosos
    reclama das corredeiras daquele rio,
    prefere águas mansas de um riacho.
    Outros empoleirados em meu muro,
    planejam invadir minha sala,
    querem tomar café comigo.

    O sangue de um tolo continua gotejando,
    e a lua não mais esmirradinha
    já não cabe em meus braços,
    hoje mora num céu iluminado,
    por estrelas distantes, tão frias.
    E o mês ainda é de outono,
    madrugada, solidão, abandono.

    A cantiga antiga e a dança de roda:
    o anel que tu me deste era fino e se quebrou,
    o amor que tu me tinhas era pouco e se acabou.


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