domingo, 4 de março de 2012

NOS DIAS DE HOJE (LUZ E SOMBRAS)


    NALDOVELHO

    O espanto da pele
    na contundência do espelho,
    a dormência da língua
    no fastio das palavras,
    o movimento silencioso
    entre o quarto e a sala,
    o café servido bem forte,
    o cheiro adocicado das manhãs,
    as notícias de ontem,
    que se repetem faz tempo.

    A artrite, a artrose,
    a ardência nos olhos,
    a janela desavergonhadamente aberta,
    os pássaros em passeata reclamam
    da escassez das migalhas pelo chão.
    A luz de um sol pálido de outono,
    o vento frio, a respiração afrontada,
    ainda sinto falta de um cigarro.
    
    Um último livro precisando ser escrito,
    versos escassos extraídos do umbigo
    num bloco de papel sobre a mesa,
    palavras inquietas que falam
    de um tempo de maior delicadeza,
    que por mais que eu me iluda,
    nem sei se de fato eu vivi.

    O dia partido ao meio,
    o assombro das horas
    no desassossego da vida lá fora...
    Aqui dentro, meu coração bate sem pressa
    para que o tempo nunca se acabe.

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