NALDOVELHO
Manhã de inverno, fim
de inverno. O dia é terça, o mês é agosto e o jornal traz noticias que eu não
quero ler. São as mesmas de sempre, nenhum novo alento, ninguém que anuncie que
um novo tempo esteja aí, já faz tempo, tentando nos surpreender.
Mudam os personagens,
às vezes o cenário, mas a história não; é sempre a mesma. Uma ajeitada no texto
em busca de novos substantivos, principalmente adjetivos... Mudam a roupagem de
um mesmo contexto para que pareça novidade e pronto! É só publicar
para que os mais desatentos, anestesiados, sedentos, possam se alimentar. Compreender
não precisa! É só estar atualizado, globalizado, integrado ao novo
milênio.
As novas notícias
mais parecem carne passada, aparentemente fresquinha, que o sulfito maquiou. E
é só verificar com cuidado para constatar o engano: pivetes, indigentes,
assaltos, favela marginalizada que o traficante tomou; crianças delinquentes,
já bem cedo armadas, são soldados infames de uma guerra urbana que ninguém
declarou. A bala perdida sempre acha um inocente; um carro roubado que passa
apressado, uma rajada de balas, cinco corpos no chão! Acerto do
tráfico, guerra de ponto, matar custa nada, nem precisa um motivo, quanta
queima de arquivo! Foi encomenda doutor! Só que por acidente, quem
passava nem tão perto, também tombou!
Prostitutas crianças
tão cedo nas ruas, inocentes, quase nuas, prontas para o prazer de algum
respeitável senhor, com família, com filhos e de aparente dignidade; na
realidade um desequilibrado que a sociedade acoitou, que
quando surpreendido, foge, covarde e apressado para não ser exorcizado
numa cadeia qualquer.
Sequestros relâmpagos
ao cidadão desarmado, indefeso, ultrajado e ao mesmo tempo culpado por ser tão
ausente, por ser conivente com algum engravatado que ao povo pilhou. Votar
custa nada! O voto comprado, pois tem sempre um canalha se dizendo doutor.
O crime, o adultério,
um marido enganado, às vezes um amante! Ainda se mata por amor! Melhor dizer,
desamor. E a justiça emperrada e as leis complicadas, Alvarás,
Liminares... Cadê o bandido? Tem juiz na parada! Obra
superfaturada! Se um prende, o outro, solta! A policia impotente se dizendo
inocente, muitas vezes envolvida, mal remunerada, falida. Já nem sei quem é o
bandido! Só sei o quanto somos desprotegidos... Em quem confiar?
E tem mais notícias
chegando: uma guerra não declarada, um atentado incoerente, crianças mortas
dentro de uma escola! O orgulho de um povo que não consegue
explicar, justificar o massacre. Coisas de uma nação que dorme com
armas nas mãos.
O fanatismo dos
religiosos, sedentos de sangue, a escrever uma história de intolerância e de
dor. E ainda tem gente que acredita em Cristo, em Maomé ou em Buda, pelo menos
é o que dizem, de facções divergentes, matando e pilhando o
opositor.
Racismo ainda é uma
chaga tão presente em nossos dias. Quantas raças irmãs, excluídas,
discriminadas, marginalizadas, a buscar um espaço. Muitos vivem num
buraco, muitos morrem de fome, muitos não têm nem um nome.
Um continente
infectado, olha a AIDS, cuidado! A igreja incoerente, enclausurada
em seus templos, preservativo é pecado! Como conter o
instinto? Como impedir um sujeito de desejar o do lado e ao sair
contaminado, contaminar um outro coitado? Quantas coisas enfiadas na cabeça tão
confusa de um pobre pecador.
E assim anoitece, e
continua o dilema, à procura de um tema para escrever um poema, mas só acho
temas amargos. Vou para a janela do quarto e é noite de lua cheia,
às vezes ela é tão doce! Quem sabe, eu me inspire? Quem sabe, eu possa
escrever uma história de amor, dessas com final feliz? Quem sabe assim apaziguar
a minha dor? Esse tipo de história faz sempre sucesso, tem tanta
gente carente, solitária, em busca do amor. Quem sabe um dia eu possa virar
escritor? Pois estou ficando cansado, correndo o risco de ficar ultrapassado, e
de não ser mais aceito pelo mercado, e isto com sessenta e tantos ou poucos
anos, considerado um velho, até mesmo inadequado por aqueles que só andam
apressados e pensam como um computador.
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