Na beira
do abismo a garrafa de conhaque atormenta em minha mente. O cigarro aceso
permanece entre os dedos, uma dúzia de rosas, ainda guardo em segredo, a
maresia da orla, a ferrugem entre os dedos, um monte de poemas rascunhados na
gaveta.
O barulho
dos carros, a insônia insistente, madrugada chuvosa. As teclas do piano, ainda
gosto de boleros, mas só os cubanos. A reforma da casa continua em meus planos,
rasguei tuas cartas, teus retratos, meus sonhos, primavera, novembro, já faz
tanto tempo, as notícias nos jornais, a esperança resiste, apesar dos enganos.
Num canto
do quarto: samambaia chorona; no outro: renda portuguesa e tem também azaleias
e um vaso de avencas. Na estante da sala: discos e livros, e eu nem tenho mais
vitrola, e faz tempo não leio, não escrevo mais poemas, doem muito e ainda
sangram. Em cima da mesa solidão e a certeza: já não me resta tanto tempo, e a
vontade anda fraca. Minhas pernas, hoje, doem, a glicose anda alta, gravei um
CD, o livro está guardado, qualquer dia eu mando, só não sei o endereço.
E no fio
da navalha, as artérias entupidas, coração anda espremido pela tal da
nostalgia, a pele ressecada pelo tempo de espera, e esse trem que não chega,
anda sempre atrasado. As malas já estão prontas, vou levando um agasalho, vai
que lá faz frio!
Estou
deixando um bilhete, quarta gaveta, lado esquerdo da cômoda, aquela do quarto!
Deixo também minha saudade, pois só serviu para manter aberta a ferida,
inspiração para um monte de bobagens, intimidades de um poeta, que eu nem sei
se vão te interessar.
Sensível coletânea de crônicas ... impressões atentas de um Bardo a desfilar.
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