terça-feira, 9 de junho de 2015

VÓ MIUDINHA E A PRENHEZ DE MARLI MENINA


NALDOVELHO

            Lembro bem como se fosse hoje: sobre a mesa da sala um jarro de cristal acolhia dúzia de rosas vermelhas misturadas com pencas de monsenhor branco. Pela janela, um sol sonolento invadia o ambiente. Na parede em frente a janela, um quadro em destaque: uma criança a pastorear suas ovelhas. Embaixo do quadro, numa confortável poltrona, Vó Miudinha lia o seu jornal. Um agradável cheiro de alfazema no ar. Na varanda o Vô fumava seu cachimbo. De repente Vó Miudinha gritou da sala:

- Manézinho chama o Tonico, eu preciso que ele vá lá na horta colher umas ervas, principalmente arruda; meu neto vai até a venda, preciso de fumo pra velha, uma garrafa de pinga das boas e um metro de fita vermelha e outro de fita amarela. desconfio que daqui há pouco eu vou ter visitas e vou precisar destes mandados pra poder trabalhar.

            E assim do nada, lá ia ela se preparar. No canto da sala, acendia suas velas, queimava seus incensos e orava para Nossa Senhora que parecia sorrir do alto do seu altar. Do lado dela, um pouco mais acima, o Cristo de braços erguidos nos abençoava. Um pouco mais abaixo, do lado esquerdo, a imagem de uma preta velha, Vovó Teresa das Almas, e do lado direito, São Lazaro e seu fiel companheiro, e muita pipoca em seu alguidar. Vó Miudinha era íntima das almas, sabia das coisas lá dos longes e das voltas que a vida costuma nos dar.

            De repente a Vó sorria e nos dizia:

- num falei, vem aí Dona Elvira e vem arrastando Marli mocinha, enjoada que num sei o quê, pra modi eu rezar. Só num sabe Dona Elvira, que reza nenhuma da jeito em barriga de menina prenha de safadeza.

            E lá ia a velha pro quarto pegar em seus guardados uns panos bordados.

- Meu velho, traz um café pra Miudinha, tá dando uma vontade de pitar um cigarro!

            Num demorou nada e Dona Elvira esbaforida entrou pela sala a arrastar Marli menina de cara amuada que chorava sem parar com medo das coisas que a Vó Miudinha pudesse falar.

            E daí em diante, foi um tal de rezas e bênçãos, acompanhadas de muito aconselhamento, pra modi Dona Elvira se aquietar e aceitar a prenhêz da menina e principalmente pra Marli menina tomar tento e sossego pra daquela barriga que viria poder cuidar.

- Menina, toma tento! Quando nascer traz aqui pra velha abençoar e qualquer coisa é só chamar.

            Vó Miudinha é muito sabida, velha danada! Até hoje eu tenho medo das coisas que ela sabe, chego a tremer quando ela senta num canto e começa a pitar seu cigarro... Sei lá o que ela descobre, sei lá o que ela resolve falar! Ainda bem que de Marli menina, num passei nem perto, garota bestinha era aquela! Mas tem outras coisas que aconteceram... Melhor deixar pra lá e tratar de me aprumar!        

            

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