NALDOVELHO
Eu
percebo um ar de delicadeza
nos
amanheceres friorentos de julho,
meu
coração enroscado em cobertas,
lá
fora uma névoa fina e fria,
aqui
dentro uma preguiça danada,
a
janela ligeiramente entreaberta,
um
vento macio, quase uma aragem,
e
o sol num bocejo a me dizer: bom dia!
Eu
percebo um ar de sutileza
no
café passado sem pressa,
a
mesa posta e a certeza
do
carinho molhado de orvalho,
você
prometeu que vinha,
chegou
bem cedo e a tempo
de
ver em meus olhos a saudade.
Eu
percebo um ar de cumplicidade
na
fumaça dos cigarros compartilhados,
no
sorriso que eu colho em seu rosto,
na
poesia que brota do seu cheiro,
que
permanece mesmo depois
que
você vai embora,
e
fica assim impregnado
por
todos os cantos e lados,
principalmente
nos travesseiros.
Eu
percebo certa leveza
nos
entardeceres passados ao seu lado,
música
suave, vinho tinto e rascante,
o
seu: ligeiramente doce e inebriante;
na
mistura de suores, odores,
salivas
trocadas, momentos sagrados,
no
adormecer e no acordar
ao
seu corpo aninhado,
ainda
que eu saiba que depois
você
irá viajar para bem longe,
deixando
travesseiros e lençóis molhados,
a
nostalgia própria de um passado,
e
a inevitável dor da solidão.
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