quinta-feira, 24 de novembro de 2016

ENCANTAMENTO DE POETA

    NALDOVELHO

    Vida que escorre, ampulheta bendita!
    Cada grão de areia um momento,
    e o tempo sedento pede por mais vida,
    e o meu coração valente resiste,
    tem sempre mais um por do sol,
    uma noite nostálgica, um poema,
    uma madrugada molhada de sonhos,
    um amanhecer em festa,
    e a passarada traz notícias dos longes,
    há sempre uma esperança no ar,
    defeito dos que creem em Deus.

    E no teto do meu quarto
    uma orquestra de pirilampos e estrelas,
    e uma lua exibida e faceira
    me chama para mais uma dança,
    mas exige que seja um bolero,
    gosta de dançar agarradinha,
    só para poder sussurrar indecências,
    lua danada, adora uma saliência!
    Seu retrato da cabeceira da cama sorri,
    e diz que eu não tomo jeito,
    adoro mergulhar numa viagem.

    Mas ao longe eu percebo
    uma cidade que transpira incertezas,
    becos sombrios, esquinas desertas, tristezas...
    Faz tempo não ando por suas ruas,
    faz tempo vivo exilado em meu jardim,
    cultivando bromélias, lírios e jasmins,
    prisioneiro dos meus próprios poemas,
    sorvendo a vida que pulsa dentro de mim.

    Encantamento de poeta! 

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