sábado, 7 de janeiro de 2017

LÁGRIMAS DE POETA


NALDOVELHO

Olhem as lágrimas que hoje escorrem, são novas feridas, posto que as antigas, restam cicatrizadas e ainda que vez por outra incomodem, é só quando muda o tempo. Acho que é assim com todo mundo, nada que deva nos assustar.

Mas ainda assim, eu sei que há quem faça muitas orações ao Pai, pedindo janelas e portas abertas, saúde, amores, fartura, proteção contra o tédio, cura paras dores da alma, para solidão e a loucura; e pedem tantas coisas, e praguejam a cada passo, a cada embaraço, ao amanhecer, ao entardecer e até na hora da Ave Maria, ao anoitecer. Mas esquecem de olhar em volta, são tantos os presentes; não percebem o dia, o nascer do sol, a magia, a poesia de viver, a suavidade da saudade e da nostalgia, que apesar da ardência que nos traz certo desconforto, fortalece e nos faz crescer.

Eu aqui no meu canto, quase não oro, fico constrangido em incomodar o Pai com minhas bobagens, com as tranqueiras que eu mesmo acumulei vida afora, com a minhas hemorragias, feridas que inflamadas incomodam... Já disse, acho que deve ser assim com todo mundo, então: melhor eu mesmo por mãos à obra, pois o Pai deve ter coisa mais importante a fazer.

Pois é, para tanto eu me utilizo da palavra poema e desconfio seriamente que esta tenha sido a melhor ferramenta que o Ele pode me fornecer, e a impressão que eu tenho é que com assim Ele esta a me dizer: vire-se, você é o comandante do barco, trabalhe, construa, abra portas e janelas, fortaleça-se para poder superar o tédio, a solidão e a loucura, cure-se você mesmo das dores da alma, aprenda a se utilizar das asas de voar por dentro, construa um novo homem, nem que para isto você tenha que nascer mil vezes, trilhar infinitos caminhos, se perder e se achar, morrer e novamente nascer, só que diferente... E esta é tua sina, o teu rito sagrado, não se esqueça, um dia, em algum lugar distante Ele pode precisar de você.

Quanto às lágrimas que hoje escorrem, deixe-as chegar ao chão, fertilize-o; lágrima de poeta é semente que um dia brotará poema, que alguém há de querer. 

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