sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A PALAVRA QUE EU TENHO - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO

   Quando a palavra que eu tenho virar pedra,
   janelas se fecharão sobre as tardes de outono,
   luzes expulsarão daqui os fantasmas,
   que abraçados aos escombros se exilarão no passado.

   Quando a palavra que eu tenho virar pedra,
   não cometerei mais a cantiga apaixonada
   e um silêncio nervoso terá tomará conta do poema,
   pois nem eu, mesmo, me lembrarei destes versos.

   Quando a palavra que eu tenho virar pedra,
   anjos e demônios comemorarão excitados,
   o triste desfecho de um enredo mal alinhavado
   e a dor sob uma lápide com o meu nome gravado.

   Quando a palavra que eu tenho virar pedra,
   pássaros amanhecerão estranhamente quietos,
   os seus ninhos tristemente desertos,
   e o sacrílego, certamente, irá aplaudir!

   Quando a palavra que eu tenho virar pedra,
   festejarei a libertação dos meus sonhos,
   e embriagado com o vinho da loucura
   viajarei para bem longe de mim.

domingo, 25 de agosto de 2013

ASSIM ME DISSE UM ANJO - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO

   No meu poema,
   as palavras nascem, crescem,
   se acasalam e dão crias,
   sob o manto de uma maldição:
   a de serem livres e hereges.
   Assim me disse um anjo
   ao me abençoar
   com o seu perdão. 
   Palavras da salvação!

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

GIRASSOL FOFOQUEIRO - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO

   Faz bem pouco tempo, 
   me revelaram um segredo:
   que a noite, madrugada sim, outra também,
   dá uma rapidinha com o dia.
   Quase ninguém percebe,
   só aqueles que buscam no orvalho
   inspiração para escrever poemas.
   Eu, que ainda tinha minhas dúvidas,
   ontem acreditei:
   girassol fofoqueiro, confirmou! 


terça-feira, 13 de agosto de 2013

NA CASA ABANDONADA - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

 
    NALDOVELHO

   Na casa abandonada
   o silêncio era um poema
   que brotava das paredes
   e trazia um cheiro forte
   de história avinagrada,
   segredos, sussurros, mistérios,   
   janelas e portas fechadas...
   E sobre a mesa da sala um bilhete,
   nele estava escrito o seu nome
   logo abaixo da palavra solidão.

O VÉU - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

 
    NALDOVELHO

   O véu esconde, nem sei onde,
   o amarelo de um sol decepcionado
   que tristonho se nega
   a iluminar os caminhos.

   O véu esconde, nem sei onde,
   o rosto da mulher amada
   que não se deu por conhecer
   e ao não se permitir o abraço
   preferiu ver o amor morrer.

   O véu esconde, nem sei onde,
   a porta, a janela, a heresia,
   a poesia de todos os dias,
   o sorriso, a lágrima, o grito,
   a palavra que não se pronuncia.

   O véu esconde, nem sei onde,
   o mistério, a adaga, o sangue,
   o pecado que não se revela,
   o tempo que ainda nos resta,
   a verdade que não se contesta.

   O véu esconde, nem sei onde,
   o livro, a chave, a loucura,  
   mas deixa espalhado pela sala
   um amontoado de sementes
   para que possamos plantar e renascer.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

PALAVRAS PÉTALAS - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO

   Alguns sentimentos
   se deixados de lado
   por conta de distanciamentos,
   viram pedra dentro da gente.
   Amor negado e esconjurado,
   envolto em frustração ou arrependimento,
   é dor cristalizada lá dentro,
   só poema consegue dissolver.
   Por isso eu cultivo sonhos
   e deles extraio palavras pétalas
   que se tratadas com delicadeza
   emprestam na feitura de um chá,
   um precioso e saboroso remédio   
   que tomo sempre ao anoitecer,
   para que assim fortalecido,
   possa abraçar meus fantasmas
   e mostrar a eles o meu bem querer.
   Acho que por isto mesmo,
   eu continue a dizer que te amo,
   sem ter medo de voltar a doer.

sábado, 3 de agosto de 2013

JAZZ - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO       

   Falhas, pequenos sulcos,
   rachaduras na armadura
   por onde passa a saudade,
   dor aguda de fratura,
   nostalgias de um poeta.
   Sinto a falta de um cigarro
   e de uma dose de absinto,
   sax tenor e um trompete,   
   baixo acústico e um piano
   insidioso e profano
   a compor meus desenganos.
   Muitas notas dissonantes
   numa pauta bem complexa,
   já não tenho vinte anos,
   a artrose incomoda
   e as palavras fazem pouco
   da tentativa de um poema
   que revele meus segredos,
   que descortine meu enredo,
   pois já não restam muitas portas,
   e se esqueço da janela aberta,
   sinto o açoite do inverno,
   não tenho mais o sangue quente
   e minha pele hoje fina,
   qualquer coisa faz sangrar.


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

SOB O MANTO DA PALAVRA INQUIETA - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO

   Sob o manto da palavra inquieta
   a menina tece sonhos,
   colhe lírios, frutas tenras,
   macera ervas, sagra seu cio,
   entrelaça enredos e o faz em segredo,
   conversa com as águas macias de um rio,
   explora caminhos de luz e amplitudes,
   amadurece na forja do seu desassossego,
   escreve páginas de pura ousadia,
   se apaixona muitas vezes, faz poesias,
   tem filhos, vertentes de outros cios,
   envelhece em seu curso e morre,
   mas permanece nas sementes que deixou.

   Sob o manto da palavra inquieta,
   a mulher que ousa o sonho
   acaba virando poeta.