domingo, 27 de outubro de 2013

CANTO TRISTE - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

    NALDOVELHO

    Eu tenho um canto triste
    engasgado na garganta,
    música que eu não ouso concretizar,
    lágrimas que acovardadas não rolam,
    face árida, sulcada pela solidão.

    Eu tenho um poema apaixonado
    que perambula pela casa,
    e que volta e meia me assombra,
    diz que precisa nascer
    antes que eu o faça morrer.

    Eu tenho uma noite de paixão
    misturada aos meus guardados,
    veneno injetado em minhas veias,
    e por mais que eu negue a saudade
    é ela que alimenta o meu coração.

    Eu tenho uma cicatriz esquisita,
    lado esquerdo do corpo,
    que na mudança de tempo incomoda,
    suas marcas, seus rastros, seu cheiro,
    paixão que eu não ouso confessar.

    Eu tenho um livro de contos,
    histórias que eu trago comigo,
    lembranças amareladas,
    uma tapeçaria inacabada,
    palavras que eu não consigo pronunciar. 

terça-feira, 22 de outubro de 2013

SEM MINHAS ASAS EU NÃO POSSO PARTIR - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

   NALDOVELHO

   No chão escorregadio
   poças d’água espalhadas, arrepio.
   No espelho, a imagem da lua refletida
   e uma vontade enorme de ir embora,
   pois a noite me chama lá fora,
   ainda assim eu permaneço aqui dentro,
   envolto em meus pensamentos.

   A vidraça embaçada denuncia
   uma madrugada friorenta que implora
   por gotas de orvalho sobre a relva sedenta.
   Muita neblina impede que eu veja o caminho,
   mas ainda assim eu sei que ele está por lá.

   Espalhados pela casa um amontoado de sonhos
   e a imagem da lua aprisionada em meus olhos.
   Aqui dentro um emaranhado de fios,
   em minhas costas a marca dos teus dentes
   e em meu corpo o desejo, a inquietude, o delírio.

   Um sol pálido e cheio de preguiça,
   se arrasta, se esforça, e finalmente nasce.
   Águas revoltas de um rio avisam,
   que nem faz muito tempo eu cheguei por aqui,
   mas que sem minhas asas eu não posso partir.


domingo, 6 de outubro de 2013

PÉ DE VENTO - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

   NALDOVELHO

   Eu sei de um pé de vento
   que às vezes venta por dentro
   e espalha pela casa
   retratos, cartas, bilhetes,
   folhas de papel manuscritas,
   poemas inacabados,
   vestígios do meu passado.
   Se eu deixo a janela aberta,
   aí é que aumenta o estrago!
    
   Outro dia encontrei numa esquina
   o seu retrato todo amassado
   e do outro lado da rua,
   o meu livro de poemas,
   bastante rabiscado.
   
   Vento que venta por dentro,
   respeite os meus sentimentos,
   preserve a minha história,
   não revele os meus segredos
   sem o meu consentimento.

sábado, 5 de outubro de 2013

UMA PALAVRA DE AMOR - POEMAS DE LUZ E SOMBRAS

   NALDOVELHO

   Não existem estradas
   de se caminhar desatento.
   Toda trajetória tem sua história,
   cada pedaço de chão, suas memórias.
   Só nos resta tentar perceber.

   Não existem pedras
   lapidadas por dentro.
   Todo o diamante translúcido agora,
   já foi opaco num tempo,
   pois qualquer pedra
   tem uma alma por dentro.
   Só nos resta fazer por merecer.

   Não existem terras
   impróprias ao semeio,
   até as áridas e escuras
   fartas de inquietude e loucura,
   um dia serão apropriadas,
   e sementes de sonho
   ali germinarão.
   Pois haverá sempre
   um poema a ser escrito,
   um resgate de um proscrito
   uma pedra a ser polida,
   um caminho de construir.

   Não existem almas
   eternamente perdidas,
   ainda que sejam muitos os abismos,
   haverá sempre ao seu tempo,
   caminhos de ir e de vir.
   E por eles certamente,
   um sorriso amigo,
   um ombro acolhedor 
   uma palavra de amor. 

terça-feira, 1 de outubro de 2013

LETRA DE MÚSICA - SAMBA DE APRENDIZ

    NALDOVELHO

   Não posso aceitar o argumento
   que diz que o meu canto
   não tem cabimento,
   é pura bobagem
   dizer que o meu samba
   não tem pedigree.

   Não quero causar desconforto,
   mas peço licença,
   desculpe seu moço!
   Fui contaminado
   ainda criança,
   samba de raiz!

   No fundo, no fundo
   do quintal lá de casa,
   registro o compasso
   que atiça a moçada,
   batuque tinhoso,
   ainda que eu seja
   um mero aprendiz.

   Por estas e outras
   não tem cabimento,
   dizer que o meu samba
   não tem o andamento
   por conta da marca
   nele estampada: 
   samba de aprendiz!
    

LETRA DE MÚSICA - SETEMBRO

    NALDOVELHO E WANDA MONTEIRO

   Nas dobras do tempo
   ergui um abrigo,
   pras coisas que eu tenho,
   perdi o juízo!
   Janelas fechadas,
   fantasmas na sala,
   lembranças que eu tenho
   de um sonho ruim.

   Por delicadeza
   deixei sobre a mesa,
   palavras rascunho
   de um novo poema,
   rasguei tuas cartas,
   retratos, bilhetes,
   matei a saudade
   lá dentro de mim.

   Abri a janela,
   colhi primavera...

   O mês é setembro!