segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

POETAS (ARQUIVO)


     NALDOVELHO

    Somos almas perdidas por atalhos, escolhas,
    trilhas confusas, desconexas;
    somos a aflição e a agonia
    de um emaranhado de versos
    que buscam aplacar as tempestades
    que existem dentro de nós.

    Somos a encruzilhada e o desvio,
    a fronteira distante e a bússola desgovernada,
    o moinho de vento que venta ao contrário,
    a tempestade no meio da tarde,
    o vento forte e bravio,
    e da palavra o seu fiel relicário;
    seres lançados à própria sorte.
     
    Somos a busca que brota insurrecta,
    a coerência dos insanos e a verdade dos profetas,
    a heresia dos magos e a adoração dos profanos,
    lembrança de um tempo de sonho e fantasia,
    dias e noites em busca de um remédio
    que possa apaziguar em nós a rebeldia.

    Somos construtores do imaginário,
    janelas e portas sem trincos, tramelas,
    e em noites de lua a nostalgia,
    alimento necessário ao nosso desgoverno,
    e para o adormecido o desassossego,
    somos caçadores da ilusão!

    Somos a partida, o caminho e o até breve,
    o pesadelo que assombra o guerreiro,
    a estalagem, a acolhida e o descanso
    daqueles que vivem em desterro,
    mergulhados no passado, acorrentados à solidão.

    Somos o que somos e ainda assim
    escrevemos poemas que falam da saudade
    e do amor que se sente,
    da lágrima derramada convulsiva
    toda a vez que sonhamos com um novo caminho,
    somos a amplitude e a coragem
    de seguir viagem em busca da libertação.

O TEU CHEIRO (ARQUIVO)


     NALDOVELHO

    Mandei construir muralhas
    de pedras, bem altas,
    que fossem inexpugnáveis,
    e lá abriguei meu silêncio,
    protegido de toda a tortura
    que teu amor pudesse trazer.

    E nesse exílio e desterro,
    assim sitiado em meus medos,
    cultivei um jardim de segredos,
    com cães a vigiar meu sono,
    com trancas, janelas, tramelas,
    lençóis tão brancos e macios,
    aquecido do açoite do frio,
    e longe da insônia insistente
    que as noites costumam trazer.

    Extraí de um veio água fresca
    para que flores pudessem crescer,
    únicas, especiais e em essência,
    por toda a ternura e carinho
    que eu fosse capaz de colher.

    Só não consegui impedir o teu cheiro,
    que trazido pela ação dos ventos,
    invadisse sorrateiramente o meu quarto,
    trazendo por maldade a saudade,
    pondo fim à solidão e ao exílio
    que ingenuamente eu me impus.

    E o coração do poeta
    acostumado a chorar poemas
    que falem do amor que ele sonha,
    apesar da dor que ele sente,
    sorri!

ORVALHO (ARQUIVO)

    NALDOVELHO

    Por quem teriam sido choradas as lágrimas
    que ao orvalhar tuas pétalas
    a noite nos testemunha agora?
    Teriam sido choradas por ti?
    Por mim, por nos dois?
    Ou teriam sido por nossa história?
    Estranho sentimento
    que ao mesmo tempo nos alimenta e devora.

    Queria saber do teu perfume,
    do viço exuberante dos teus olhos.
    Será que eles se fariam tão contundentes
    sem o sereno da noite?
    Será que lágrimas teriam sido necessárias?
    Será que o manchar com sangue,
    a evidenciar os cortes,
    por tanto e quanto amor ferido,
    não teria sido o lapidar constante
    para fazer-nos mais fortes?

    Quisera saber as respostas,
    quisera poder revelar tais mistérios
    e fazer com que o amor não tivesse
    que se submeter ao segredo.
    Quisera que a nossa história
    tivesse outro enredo;
    um com princípio, meio,
    mas que não tivesse fim.

domingo, 30 de dezembro de 2012

RECEITA PARA SE GERAR UM POETA (ARQUIVO)


     NALDOVELHO

    Uma pitada de mistério,
    dose e meia de magia,
    muita luz que é para adequar a massa
    ao ponto certo de sua evolução.

    Feitiço feito sem pressa,
    muitas imagens, cores, matizes,
    uma detalhada e preciosa mandala
    construída pela imperfeição.

    Junte a isso tudo a poesia
    de palavras expostas em versos,
    a mostrar que é no interior da massa
    que reside o segredo e a resposta
    que irá decifrar a esfinge
    e descortinar a verdade
    que nos levará à compreensão.

    Não esquecer de condimentar,
    sempre que possível,
    com muita inquietude,
    que é o alimento do artista,
    mola mestra de sua inspiração.

    Depois, é dar-lhe o sopro da vida,
    que certamente lhe será generosa
    com muitas vivências, querências,
    muita alegria e lágrimas,
    vitórias, derrotas, batalhas,
    pois esta é a têmpera ideal
    dos que estão fadados a crescer.

    Necessário também que o ser
    seja revestido de alguns dotes:
    principalmente, a ternura e o caráter
    daqueles que são fortes,
    pois muito será exigido
    daqueles que são abençoados
    pela força desta maldição.

POEMAS QUE EU TENHO (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

   Certos poemas
   permanecem encruados,
   como farpas cristalizadas
   em minhas entranhas.
   Recusam-se aos versos
   e não se revelam confessos
   das palavras que a vida    
   ensinou pela dor.
   Quando nascem,
   paridos, exprimidos,
   se mostram ardidos;
   lacônicas escolhas,
   manhãs sombrias
   que o verso nos impõe.

   Há aqueles,
   exuberantes nas folhas,
   palavras, imagens
   que revelam correntes
   de emoções incontidas,
   em viagens, passagens,
   vivências, querências,
   escolhidas sementes
   a mostrar que a ferida
   enfim cicatrizou.

   Há também aqueles
   que não se permitem às palavras
   por serem em excesso
   em seus significados,
   presentes tão raros,
   como o sorriso de uma criança,
   o abraço de um amigo,
   o beijo da mulher amada
   que de tão desejada
   chega a nos causar dor.

   Poemas, presentes que eu ganho,
   da vida que eu vivo,
   dos sonhos que eu sonho,
   da lágrima exibida,
   sem vergonha e assumida,
   na emoção que eu trago
   pelas coisas desta vida.

sábado, 29 de dezembro de 2012

POEMA AO AMOR QUE EU AMO (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

    Eu quero beijos molhados,
    de língua na língua, abusados,
    e de preferência demorados.
    Eu quero a saliva trocada,
    com gostos entranhados,
    e cheiros misturados.

    Eu quero ser o amante,
    o segredo guardado,
    o discípulo e o mestre sagrado
    e quero que seja sem cobranças,
    sem acidez ou desesperanças,
    para que possamos ser,
    de um jeito, descompromissados,
    sem ardências, ou amargos,
    nem cheiro de fruto mofado.

    Eu quero escrever o seu nome
    com letras que brotem indecentes
    de cheiros, sabores, texturas,
    poema ao amor que eu amo
    e que nunca mais vou esquecer.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

O REFLEXO DA TUA IMAGEM (ARQUIVO)

     NALDOVELHO       

    O reflexo da tua imagem
    impunemente no espelho,
    traz-me o imaginar atrevido
    das coisas até hoje escondidas 
    por entre palavras, mistérios,
    guardados que o tempo,
    por bom senso e prudência
    achou por bem preservar.

    Este teu olhar atrevido,
    com um ar de queira ou não queira,
    num misto de medo e segredo
    e com jeito de seja ou não seja;
    é de certa forma o melhor enredo
    a provocar o poema e a seduzir o poeta.

    E aí é só colheita de versos,
    é só emoção incontida
    e eu me confesso, indefeso,
    pois a beleza que vejo no espelho
    vem da matriz dos meus desejos,
    do objeto dos meus sonhos,
    do alvo da minha paixão.

    Portanto é melhor preservar o silêncio,
    melhor aquietar-me em meus versos,
    pois o veneno que eu percebo em teus lábios,
    é dose demais pros meus planos,
    é bem mais do que eu consigo suportar.

O POUCO QUE NOS RESTOU (ARQUIVO)


     NALDOVELHO

    Pétalas pálidas, descoradas, descontentes,
    folhas desnutridas, desmaiadas, quase sem vida...
    Espinhos ressecados, ainda ferem o inocente.

    Um jardim tão mal cuidado, o jardineiro se fez ausente,
    ervas daninhas dominam o ambiente...

    O amor que tu me tinhas, hoje é morto, se acabou.
    Casa assobradada, janelas e portas trancadas,
    um velho balanço, enferrujado, range os dentes.

    Nada que eu faça ou tente, resgata meu passado;
    memórias reticentes, foi o pouco que restou.

    Velho casarão abandonado no passado,
    rua arborizada que o tempo preservou.

    Nas esquinas, conversa miúda, sem eira nem beira.
    Já não somos os mesmos, quase nada nos restou.

AQUELE QUE SE FAZ DE MORTO (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

    Aquele que se faz de morto,
    em silêncio esconde a lágrima
    e ao negar seu pranto,
    apenas se anestesia
    para não permitir
    que a danada da nostalgia
    lhe invada o corpo.

    Morde os lábios
    para calar o canto
    e cola em seu rosto
    um sorriso frouxo,
    tipo calmaria, coisa vazia,
    que aborta na nascente
    tudo aquilo que um dia
    poderia ter sido poesia.
    
    Ou então faz da dor, ferida latente
    que vez por outra incomoda,
    mas não o suficiente,
    só que em suas entranhas crescem
    emaranhados de teias
    e ele nem sente,
    até virar apenas um nome
    escrito sobre a pedra fria.

    Aquele que se faz de morto,
    só encontra em seus sonhos
    desconexas paisagens,
    e não se entrega a viagens,
    não se permite à coragem
    e destrói suas raízes,
    vira um simples adorno,
    uma bobagem.

    Aquele que se faz de morto,
    nega o conflito à razão
    e em coma induzido se esconde
    e não se permite à paixão.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

O INESPERADO (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

   O inesperado se apressa
   e altera meus planos.
   Violões em conversa
   exorcizam enganos.
   Um clarinete desperta,
   insidioso e profano,
   um coração inquieto,
   já faz muitos anos.

   A lágrima se revela
   e denuncia meus sonhos.
   A madrugada conspira,
   se contorce, transpira.
   O orvalho da noite
   denúncia o estrago.

   O prazer de uma dança,
   uma garrafa de vinho,
   encorpado e rascante.
   Quem sabe então
   possamos amanhecer?

UM ANJO CUJO O NOME É SEGREDO (PROSA POÉTICA)




NALDO VELHO

Tem dias que eu acordo meio amuado, pensativo e acabrunhado, achando que a minha poesia se perdeu por desvios, trilhou atalhos errados na ilusão de que ali adiante existia um rio que iria matar minha sede de falar as coisas que eu penso, e outras que tanto quero e que por ser um poeta eu sonho, e que por conta de tantas amarras eu nunca vivi.

Tem dias que as palavras brotam vazias, ocas de significados e aí surgem lá das funduras, uma agonia e gastura danadas, de achar que não mais vale a pena ficar debruçado em versos, a tentar desencravar meus cacos e a tirar das entranhas os espinhos, pois quem sabe a dor que me habita pudesse abrir um novo caminho e mostrar pra toda essa gente que a poesia apesar de um dom, é também uma maldição.

Nesses dias eu fico calado, a observar a palavra estranha, expelida impensada e afiada, em diálogos vazios, e entrecortados, que circulam com força tamanha sem a preocupação de buscar-se a verdade, o entendimento e a compreensão. E cada vez mais eu me calo, fico tristonho e arredio, fazendo força para ignorar meus versos, pois certamente o que eu penso nada irá acrescentar.

Só que de repente me surge um anjo, cujo nome eu mantenho em segredo, a mostrar que esse dia é o contraste pelo qual o verbo transita quando em busca da razão se conflita e faz aguçar a nossa percepção. Ainda bem que viestes em meus sonhos, a mostrar que a sensibilidade impera, nos braços da mulher amada, no colo quente da amante e no beijo molhado do orgasmo, pois o amor que hoje eu tenho é fonte preciosa e tamanha, a provar que a poesia é sagrada e que dela eu não posso abrir mão.

UM ANJO ESCONDIDO NAS SOMBRAS (PROSA POÉTICA)



NALDOVELHO

Faz tempo eu percebo sua presença, sua sombra de relance, o contorno do seu corpo e até o seu cheiro. Só não consegui ainda ver o seu rosto! Não sei da cor dos seus olhos, nem da textura da sua pele e já faz um bom tempo que eu carrego a impressão da sua voz em meus ouvidos, meio rouca, palavras poucas, pelos sofrimentos que você teve que passar.

Outro dia quase que lhe vi por inteira! Cheguei a ficar afrontado. Suor frio, coração descompassado, e de tão nervoso até pensei: chegou o dia afinal!  Mas era um engano, ainda não havia chegado a hora de tê-la concretamente ao meu lado.

Faz tempo que eu sei que você me sonda. Todas as noites ao passar pelo meu quarto e ao debruçar sobre o meu corpo adormecido, você toca de leve com seus lábios o meu rosto e o que fica é uma sutil impressão de frescor pelo ar.

Noite dessas, achei que acarinhava o meu cabelo. Mantive então os meus olhos fechados para não quebrar o encanto, pois a energia que me envolvia era de extrema delicadeza e restaurava a paz em meu ser.

Faz tempo eu sei que não existe engano, que se você aqui está, é porque eu estou nos seus planos, pois vai ser chegado o momento de me levar cuidadosa para o aconchego do seu colo, para depois secar o meu pranto, tirar minha dor e cicatrizar-me as feridas.  Sei também que esse aconchego não será para todo o sempre, pois logo deverei retornar ao caminho, pois ainda é longa a jornada em busca do meu destino.

Faz tempo percebo a sua presença e é bom saber que é uma mulher, e confesso-lhe: não lhe tenho medo! Apenas uma paciente espera, pois sei que o que me reserva, tem cheiro e gosto da aurora de uma nova iniciação.

O AMOR QUE ELE NOS OFERTOU (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

   Quando Ele aqui chegou,
   trouxe em suas mãos  
   muitas sementes,
   trouxe o fogo, a terra e o ar,
   a luz do sol e a luz do luar,
   trouxe também a água
   que do céu fez jorrar,
   sulcou leitos de rios
   para irrigar toda a terra
   e numa alquimia perfeita
   criou as águas do mar.
   Trilhou muitos caminhos,
   semeou em todos a verdade,
   deixou marcas profundas,
   suas revelações...

   Quando Ele aqui voltou,
   ao se reunir com os seus,
   os chamou de Homens do Caminho
   e disse-lhes para semear a Boa Nova.
   Conclamou-os a libertarem-se,
   a desafiar os próprios limites,
   a vencer suas paixões
   e a submeter suas vontades,
   para que atingida a maioridade,
   se transformarem guardiões
   de toda a verdade!

   Hoje tanto tempo depois,
   quando nos reunimos em Seu Nome
   para lembrá-Lo e  comemorá-Lo,
   ou até mesmo para tentar compreendê-Lo,
   quão distantes ainda estamos
   de sermos capazes de olhar,
   ou mesmo perceber sua imensa luz.
   E mesmo que os seus sinais
   ainda estejam tão presentes,
   quão descrentes ainda somos,
   incapazes mesmo de entender
   a delicadeza do amor
   que Ele nos ofertou.

UMA CERTA BRISA QUENTE (LETRA DE MÚSICA)


 
    http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/42465

   NALDOVELHO

   Seu rosto, seu semblante,
   sua voz distante,
   seus passos firmes
   em busca do amanhã.

   Do encontro fez-se o desencontro,
   de quem não viu, nem sentiu
   que o amanhã surgiu,
   numa certa brisa quente.

   Foi meu mar, meu chão,
   foi meu céu quem me avisou,
   da passagem que eu não vi
   na hora certa que se foi.

   No seu jeito simples,
   no seu olhar despreocupado,
   seu rosto, seu semblante,
   em sua voz mais distante,
   mais distante...

   Foi meu mar, meu chão,
   foi meu céu quem me avisou
   da passagem que eu não vi
   na hora certa que se foi.

   No seu jeito simples,
   no seu olhar despreocupado,
   seu rosto, seu semblante,
   em sua voz mais distante,
   mais distante...

   (Música composta por Jose Paulo de Resende)

VIAGEM (LETRA DE MÚSICA)


    NALDOVELHO

   Vou,
   mas vou inteiro em viagem,
   por passagens camufladas
   pelas ruas da cidade,
   lua cheia de saudade
   das esquinas das conversas,
   madrugadas que eu vivi.

   Tenho
   um violão que anda tristonho,
   pois na busca dos meus sonhos,
   poesia ficou quieta,
   sufocada pela pressa,
   desencontros de partidas,
   desatinos que eu vivi.

   Levo
   em minhas malas coisa pouca, 
   um olhar despreocupado,
   esperança ainda acesa,
   poesia, com certeza,
   vai brotar plena e confessa
   e num sorriso apaixonado,
   vai mostrar por onde ir.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

VELHO CAIS (ARQUIVO)


    NALDOVELHO

   Velho cais, madeira velha,
   velha embarcação pro ancoradouro.

   No açoite do tempo, lento, 
   um grito louco rosna o vento,
   um grito rouco range o barco.

   No roçar das águas claras
   madeira velha, tanto tempo!

   Fim de tarde o sol se põe,
   águas finas que se partem,
   velha embarcação pro ancoradouro.

   Vento brando, maré baixa,
   vento mudo, maré mundo.

   No cansaço o litoral,
   mundo mar vai marejando
   mareando o velho cais.

   E o velho só dando nós.
   lembrando o velho timão,
   contando antigas histórias,
   ancorado nas lembranças.